DIREITO EMPRESARIAL III
AULA 05 (21/03/11)
1) Juízo Falimentar:
A matéria de falências é atinente à justiça comum estadual, não se cogitando de juizado especial, independentemente do valor.
Dessa forma, o juiz competente para apreciar o pedido de falência é o mesmo juiz competente para apreciar o pedido de recuperação judicial e homologar o plano de recuperação extrajudicial. Nos termos da Lei nº 11.101/05, é o juízo do local do principal estabelecimento do devedor. Com efeito, é o que dispõe o art. 3º da Lei nº 11.101/05:
“É competente para homologar o plano de recuperação extrajudicial, deferir a recuperação judicial ou decretar a falência o juízo do local do principal estabelecimento do devedor ou da filial de empresa que tenha sede fora do Brasil”.
a) Legislação anterior:
A anterior lei que tratava do processo falimentar e do processo de concordata (atualmente substituída pelo processo de recuperação judicial), Decreto-Lei nº 7.661/ 45, dispunha, no caput do art. 7º, que “é competente para declarar a falência o juiz em cuja jurisdição o devedor tem o seu principal estabelecimento ou casa filial de outra situada fora do Brasil”.
Em termos de competência, não há diferença entre a legislação anterior e a atual. O que houve de alteração foi o verbo: anteriormente se utilizava “declarar” e, atualmente, se utiliza “decretar”, a fim de evitar erros quanto à natureza da sentença da ação falimentar (constitutiva, e não declaratória).
b) Conceito de principal estabelecimento:
O conceito de principal estabelecimento não se confunde com o de sede da sociedade empresária, prevista nos atos constitutivos (estatutos ou contratos sociais). Não se deve confundir também com o local onde ocorram as maiores vendas. Nem tampouco, com o local onde haja o maior número de funcionários. Também não necessariamente é aquele onde as principais decisões, do ponto de vista jurídico e administrativo, são tomadas. O principal estabelecimento é “o centro vital das principais atividades do devedor”, segundo o STJ:
O Superior Tribunal de Justiça, em harmonia com a doutrina de Carvalho de Mendonça, firmou o entendimento de que "'estabelecimento principal é o local onde a atividade se mantém centralizada', não sendo, de outra parte, 'aquele a que os estatutos conferem o título principal, mas o que forma o corpo vivo, o centro vital das principais atividades do devedor'" (CC n. 32.988/RJ, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ: 04/02/2002).
Ou seja, pode-se concluir que, havendo conflito de competência a respeito do juízo competente (o que é raro, considerando que na maioria das vezes o principal estabelecimento é bem definido), o Tribunal competente julgará a depender do caso concreto.
OBS: O critério preponderante para fixação da competência é, portanto, territorial, mas nesse caso é de forma absoluta (em regra, a competência territorial é relativa), não sendo passível, dessa forma, de prorrogação (parece razoável que seja competência absoluta, tendo em vista o número de interesses que perpassam o processo falimentar).
2) Juízo universal da Falência:
Nos termos do art. 76 da Lei de Falências, o juízo da falência é indivisível e competente para conhecer todas as ações sobre bens, interesses e negócios do falido. Mas essa regra comporta algumas exceções.
Assim, quando o juiz decretar a falência, em regra extingue-se a sociedade empresária e surge a massa falida, a qual assumirá todas as ações sobre bens, interesses e negócios do falido, de competência do juízo universal.
a) Ações trabalhistas:
As ações trabalhistas, ajuizadas antes ou depois da decretação da falência, permanecem nas varas trabalhistas. Obtendo o empregado um título executivo judicial, deverá habilitá-lo no juízo falimentar.
b) Ações fiscais:
As ações fiscais obedecem à Lei do Executivo Fiscal (Lei nº 8.630/80). Os créditos fiscais sequer são habilitados no juízo falimentar. Mas, para serem pagos, deverão observar a ordem prevista no art. 83 da Lei nº 11.101/05.
c) Ações em que o falido seja autor ou litisconsorte ativo (possibilidade de ser detentor de direito que pode ser convertido em crédito):
Essas ações tramitarão nos juízos ordinários, salvo aquelas que sejam reguladas pela Lei de Falências, como a ação revocatória e a ação de ineficácia.
d) Ações de competência da Justiça Federal:
As ações de competência da Justiça Federal (art. 109 da Constituição Federal) afastam o juízo universal da Falência.
3) Massa falida:
Massa falida é o conjunto de bens, direitos e deveres que antes estavam sob a administração da sociedade empresária/empresário que teve sua falência decretada e foi atribuída à responsabilidade de um administrador judicial.
A massa falida pode ser analisada sobre dois aspectos: massa falida subjetiva e massa falida objetiva.
MFS é o conjunto dos credores, que, em regra, devem habilitar seus créditos perante o juízo falimentar.
Por outro lado, a MFO é o conjunto de bens pertencentes à massa falida, que integrarão o ativo apto a honrar os compromissos e obrigações da massa.
4) MFO – Massa falida objetiva:
Uma vez decretada a falência, todos os bens do falido serão arrecadados pelo administrador.
OBS: O processo falimentar termina quando os bens se esgotarem ou quando todos os credores forem satisfeitos. Em outros termos, o processo falimentar termina quando se esgota a MFS ou a MFO.
a) “Afluentes” da MFO:
· Arrecadação: é a reunião de todos os bens do falido, após a decretação da falência, sob custódia do administrador;
· Arresto: Pode ser utilizado para os bens indeterminados;
· Seqüestro: pode ser utilizado para bens específicos;
· Ação revocatória;
· Ação inespecífica;
· Ação anulatória.
OBS 1: As ações revocatória e inespecífica atacam a eficácia do negócio, enquanto que a ação anulatória ataca a validade do negócio.
OBS 2: Arrecadação versus penhora: Enquanto a penhora deriva de um mandado de penhora, que é deferida pelo juiz da causa, a arrecadação é realizada pelo administrador judicial, nos processos de falência.
Bens impenhoráveis não se confundem com bens irrecadáveis. Aqueles estão previstos na Lei dos Bens de Família e no art. 649 do CPC. Por outro lado, os bens da sociedade empresária pertencem a uma pessoa jurídica, cujos bens não se confundem com os bens de seus sócios e/ou administradores (salvo os casos de confusão patrimonial, em que é possível a despersonificação da pessoa jurídica).
Assim, podemos concluir que todo bem penhorável é arrecadável, mas nem todo bem arrecadável é penhorável.
b) “Vazantes” da MFO:
· Pedidos de restituição;
· Embargos de terceiro;
· Pagamentos antecipados.
5) Atos ineficazes em relação à massa:
Nos termos do art. 129 da Lei nº 11.101/05, são ineficazes em relação à massa falida, tenha ou não o contratante conhecimento do estado de crise econômico-financeira do devedor (uma espécie de responsabilidade objetiva), seja ou não intenção deste fraudar credores, os seguintes atos:
a) O pagamento de dívidas não vencidas realizado pelo devedor dentro do termo legal, por qualquer meio extintivo do direito de crédito, ainda que pelo desconto do próprio título.
Caso o devedor tenha realizado pagamento a um credor, antes do vencimento, e antes da decretação da falência, porém dentro do termo legal, o pagamento será suspenso e aquele que recebeu deverá restituir o numerário obtido.
Exemplo: Dívida com vencimento em 01/04 foi paga em 03/01, tendo sido a falência decretada em 21/03. O pagamento foi válido e eficaz entre as partes, no entanto, não o foi perante a massa falida. Este credor, assim como os demais, somente poderá receber seu crédito após o concurso de credores.
OBS: No momento em que o juiz decreta a falência, todos os vencimentos são antecipados e suspensos os pagamentos.
b) O pagamento de dívidas vencidas e exigíveis realizado dentro do termo legal, por qualquer forma que não seja a prevista pelo contrato.
Nesta situação a dívida venceu e se tornou exigível, mas o pagamento foi feito de forma diferente daquela que estava estipulada (ex: pagamento em produtos, enquanto estava previsto o pagamento em dinheiro).
c) A constituição de direito real de garantia, inclusive a retenção, dentro do termo legal, tratando-se de dívida contraída anteriormente; se os bens dados em hipoteca forem objeto de outras posteriores, a massa falida receberá a parte que devia caber ao credor da hipoteca revogada.
d) A prática de atos a título gratuito, desde 2 (dois) anos antes da decretação da falência.
Exemplos de atos gratuitos: doação, comodato, mandato gratuito, depósito gratuito, mútuo gratuito, fiança, dentre outros.
OBS: Esse prazo de 02 anos independe do período de “termo legal”.
e) A renúncia à herança ou a legado, até 2 (dois) anos antes da decretação da falência.
f) A venda ou transferência de estabelecimento feita sem o consentimento expresso ou o pagamento de todos os credores, a esse tempo existentes, não tendo restado ao devedor bens suficientes para solver o seu passivo, salvo se, no prazo de 30 (trinta) dias, não houver oposição dos credores, após serem devidamente notificados, judicialmente ou pelo oficial do registro de títulos e documentos.
Este é o denominado “contrato de trespasse” (venda ou transferência de estabelecimento). Para que ele seja eficaz perante a massa falida, deverá ter sido realizado com o consenso dos credores existentes ou havendo numerário suficiente para cobrir o passivo da sociedade empresária.
Existe controvérsia a respeito do prazo a que se refere este artigo, uma vez que não houve menção de prazo algum. Para o professor, este artigo seria aplicável para trespasses realizados a qualquer tempo (ante a ausência de especificação).
g) Os registros de direitos reais e de transferência de propriedade entre vivos, por título oneroso ou gratuito, ou a averbação relativa a imóveis realizados após a decretação da falência, salvo se tiver havido prenotação anterior.
Após a decretação de falência, nenhum terceiro poderá registrar imóvel adquirido da sociedade empresária, salvo os casos em que o terceiro der entrada no registro antes da data da sentença.
6) Termo legal:
O termo legal é o lapso temporal, fixado pelo juiz na sentença de decretação de falência, em que os negócios e atos praticados pelo falido são passíveis de revogação ou ineficácia. É um período de até 90 dias para trás, contados do pedido de falência ou do 1º protesto.
A sentença que decreta a falência é constitutiva e, portanto, possui efeitos ex nunc (não retroativos). Todavia, existe a flexibilização da não-retroatividade, resultando no período do termo legal.
Conforme a doutrina, este prazo de até 90 dias conta-se a partir do 1º protesto se este for essencial ao pedido (nas hipóteses do art. 94, I da Lei de Falências), ou do pedido, nos demais casos (ex: auto falência, execução frustrada e prática de atos de falência).
7) Período suspeito:
O lapso de 2 (dois) anos contados da decretação de falência, em que os negócios e atos praticados pelo falido são passíveis de revogação ou ineficácia é denominado pela doutrina de período suspeito.