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quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Aula 04 de Direito Civil V (19/08/2010)

DIREITO CIVIL V


 
AULA 04 (19/08/2010)



CONTINUAÇÃO DA CLASSIFICAÇÃO DA POSSE



1) Posse justa e posse injusta:




Art. 1.200. É justa a posse que não for violenta, clandestina ou precária.


Pode-se perceber que não há um conceito positivo de posse justa. Entende-se a posse injusta, por seu turno, como a posse violenta, clandestina ou precária.

A violência, a clandestinidade e a precariedade são denominadas vícios objetivos da posse, pois esses vícios se encontram em um plano externo, independente da cognição do possuidor e são passíveis de comprovação concreta.

Será justa a posse que não contiver algum desses vícios.



a) Posse violenta:

Essa violência pode ser tanto física (vis absoluta) quanto psicológica (vis compulsiva).

A violência cessa quando o anterior possuidor desistir de reaver a posse do bem esbulhado.


OBS: A posse violenta é sempre uma posse esbulhada (o esbulho ocorre quando uma pessoa tira a posse de alguém).



b) Posse clandestina:

É a posse que ocorre às ocultas, “na calada da noite”. É aquela em que não há publicidade, não há conhecimento de terceiros.

A clandestinidade cessa quando a coletividade toma conhecimento de que o bem está sendo possuído por pessoa estranha.



c) Posse precária:

É a posse na qual há um abuso de confiança por parte do possuidor. O possuidor já tinha a posse ou a detenção do bem.

Ex: locatário que decide não devolver o bem.

Conforme construção doutrinária e jurisprudencial (majoritária), a precariedade cessa com o tempo. O tempo, aliado à inércia do possuidor indireto, gera a cessação da precariedade.

OBS: O problema se encontra na subjetividade conferida a “tempo”.



Enquanto não cessada a violência e a clandestinidade não existe posse, havendo mera detenção por parte do violento/clandestino:



Art. 1.208. Não induzem posse os atos de mera permissão ou tolerância assim como não autorizam a sua aquisição os atos violentos, ou clandestinos, senão depois de cessar a violência ou a clandestinidade.


Cessada a violência e a clandestinidade, deixa de existir detenção e haverá posse, na modalidade injusta (pois o modo como o bem da vida foi adquirido perdura sobre a posse).

OBS: A jurisprudência majoritária aplica à precariedade as mesmas normas relativas à violência e à clandestinidade, embora não esteja incluída no art. 1.208 do Código Civil. Assim, a pessoa que adquire o bem de forma precária não possui sua posse, mas mera detenção. A posse precária, injusta, só existirá quando houver a cessação da precariedade.

A posse injusta pode se convalescer, tornar-se justa. O simples passar do tempo não a tornará justa.

Ex: se o antigo possuidor faz um negócio com o novo possuidor, se há compra do bem, etc.




Art. 1.203. Salvo prova em contrário, entende-se manter a posse o mesmo caráter com que foi adquirida.



2) Posse de boa-fé e posse de má-fé:


É uma classificação de caráter subjetivo, pois é necessária uma análise das pretensões do possuidor.

Tem-se aqui um critério subjetivo, no sentido de se verificar se o possuidor tem, ou não, ciência do vício que macula a sua posse. Convém assinalar que a doutrina majoritária considera essa boa-fé como sendo a boa-fé subjetiva, embora o Código Civil, em regra, adote a boa-fé objetiva.


Art. 1.201. É de boa-fé a posse, se o possuidor ignora o vício, ou o obstáculo que impede a aquisição da coisa.


OBS: É possível que haja posse de boa-fé que seja injusta.

Ex: Aluguel de um apartamento pelo vizinho, após uma viagem dos proprietários.

A posse do vizinho é injusta (clandestinidade) e passará para o locatário esse caráter. Assim, o locatário terá posse de boa-fé e injusta concomitantemente.


Parágrafo único. O possuidor com justo título tem por si a presunção de boa-fé, salvo prova em contrário, ou quando a lei expressamente não admite esta presunção.


A boa-fé cessa quando se torna inequívoco que o possuidor sabe que sua posse é injusta.


Art. 1.202. A posse de boa-fé só perde este caráter no caso e desde o momento em que as circunstâncias façam presumir que o possuidor não ignora que possui indevidamente.


A boa-fé e a má-fé são relevantes no que diz respeito ao prazo da usucapião, aos frutos, problemas, benfeitorias e ao direito de retenção.




3) Composse e posse exclusiva:



a) Composse:

Diferentemente da propriedade, admite-se que haja a posse concomitante de dois sujeitos sobre o mesmo bem da vida. A isso se dá o nome de composse, ou posse simultânea.

Exemplo: Moradores de uma república.

A composse pode ser:

Pro diviso;

Pro indiviso.

Pro diviso: há clara delimitação/divisão do bem que é possuído (ex: cada morador da república tem o seu quarto). Há uma divisão fática, que repercute na esfera jurídica.

Pro indiviso: não há divisão (ex: bens de um casal casado no regime de comunhão).

OBS: É possível a defesa da posse em uma composse, desde que ela seja pro diviso.



b) Posse exclusiva:

Não havendo composse, a posse será exclusiva, o que não impede que seja paralela, pois a posse desmembrada também pode ser exclusiva.


Ex: Entre o locador e o locatário não há composse, mas apenas posse paralela. A posse de cada uma dessas partes será exclusiva: uma posse será exclusiva direta e a outra, posse exclusiva indireta.


OBS: O locatário estará em composse quando morar mais de uma pessoa no imóvel.


Art. 1.199. Se duas ou mais pessoas possuírem coisa indivisa, poderá cada uma exercer sobre ela atos possessórios, contanto que não excluam os dos outros compossuidores.




4) Posse ius possessionis e ius possidendi:



a) Posse ius possessionis ou posse formal:

É a que deriva da posse autônoma, independentemente de qualquer título. É o direito fundado no fato da posse. É o direito de ser possuidor. “Possideo quod possideo”, é a “posse pela posse”.

É a posse de um invasor.



b) Posse ius possidendi ou posse causal:

É o direito à posse, conferido ao portador de título devidamente transcrito.

É a posse do locatário, do comodatário.





5) Posse nova e posse velha:


Segundo a doutrina, e na esteira do Código de Processo Civil (o atual Código Civil aboliu essa nomenclatura), posse nova é a posse de menos de ano e dia. Posse velha é a posse de mais de ano e dia.

Essa distinção é relevante quando se busca a liminar em ações possessórias, bem como quando se discute qual a melhor posse.


OBS: A posse deve ser protegida para quem efetivamente precisa dela.





AQUISIÇÃO DA POSSE



Art. 1.204. Adquire-se a posse desde o momento em que se torna possível o exercício, em nome próprio, de qualquer dos poderes inerentes à propriedade.






Art. 1.205. A posse pode ser adquirida:


I – pela própria pessoa que a pretende ou por seu representante;


II – por terceiro sem mandato, dependendo de ratificação.


Poderes inerentes à propriedade: usar, gozar, dispor e reivindicar.

O Código Civil de 2002 optou por atrelar a aquisição da posse à possibilidade de exercer algum dos poderes (ou atributos) inerentes à propriedade, como se observa do art. 1.204, criando um paralelo com o disposto no art. 1.196.


Art. 1.196. Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade.



OBS: O Código Civil de 1916 adotava outra sistemática, enumerando as hipóteses em que era possível adquirir a posse. É que se observa no art. 493 do CC de 1916:



Art. 493. Adquire-se a posse:


I - pela apreensão da coisa, ou pelo exercício do direito;


II - pelo fato de se dispor da coisa, ou do direito;


III - por qualquer dos modos de aquisição em geral.


É possível a utilização dessas hipóteses no vigente sistema jurídico brasileiro.




TRANSMISSÃO DA POSSE



Art. 1.206. A posse transmite-se aos herdeiros ou legatários do possuidor com os mesmos caracteres.


Ou seja, se era de boa-fé, má-fé, justa, injusta, direta ou indireta, etc., manterá esse caráter quando transmitida.



Observação:

• Herdeiro é aquele que recebe um quinhão, uma parte do patrimônio deixado pelo de cujus;

• Legatário é aquele que recebe um bem definido.



Art. 1.207. O sucessor universal continua de direito a posse do seu antecessor; e ao sucessor singular é facultado unir sua posse à do antecessor, para os efeitos legais.


Pelo visto, a posse pode ser adquirida a título universal ou a título singular:

a) Aquisição da posse a título universal: ocorre quando o indivíduo recebe a posse da integralidade de um patrimônio ou da fração ideal de um patrimônio. Nesse caso continuará obrigatoriamente a posse do antecessor.

b) Aquisição da posse a título singular: o adquirente recebe a posse de uma coisa especificada, individualizada. Aqui, o adquirente poderá ou não continuar a posse do antecessor.

A continuação da posse do antecessor é importante na análise das suas características.

OBS: Constituto possessório: é uma espécie de transmissão ficta da posse. É a transferência da posse sem que tenha havido contato físico com a coisa.

Exemplo: venda de um apartamento a alguém, sendo que o antigo proprietário continua morando no imóvel, através de um contrato de aluguel.




AÇÕES POSSESSÓRIAS



1) Espécies:

As ações possessórias, ou interditos possessórios, são instrumentos processuais que permitem ao possuidor defender a sua posse contra terceiros.

Estão disciplinadas nos arts. 920 a 933 do Código de Processo Civil.

No Código Civil, as ações possessórias estão delineadas nos arts. 1.210, 1.211 e 1.212:


Art. 1.210. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação, restituído no de esbulho, e segurado de violência iminente, se tiver justo receio de ser molestado.


§ 1o O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou restituir-se por sua própria força, contanto que o faça logo; os atos de defesa, ou de desforço, não podem ir além do indispensável à manutenção, ou restituição da posse.


§ 2o Não obsta à manutenção ou reintegração na posse a alegação de propriedade, ou de outro direito sobre a coisa.



Ou seja, em uma disputa entre o possuidor e o dono, no campo possessório vencerá quem tiver a melhor posse. Já no campo petitório, o proprietário venceria a disputa.


Art. 1.211. Quando mais de uma pessoa se disser possuidora, manter-se-á provisoriamente a que tiver a coisa, se não estiver manifesto que a obteve de alguma das outras por modo vicioso.


Este é o considerado princípio da inércia: o bem continua com que já está na sua posse.



Art. 1.212. O possuidor pode intentar a ação de esbulho, ou a de indenização, contra o terceiro, que recebeu a coisa esbulhada sabendo que o era.

Este artigo reforça/positiva a idéia de que a posse é relativa (o caráter relativo da posse). Se o terceiro que receber a coisa não souber que a coisa era esbulhada, estará de boa-fé, e então o possuidor primário não poderá intentar ação contra ele, restando-lhe acionar o intermediário que transmitiu o bem.


Três são as ações possessórias: manutenção de posse, reintegração de posse e interdito proibitório. Há uma quarta, o embargo de terceiro, que será estudado em aula futura.



a) A manutenção de posse é a via adequada para o possuidor defender-se de turbação, que se trata da tentativa de tirar a posse do possuidor.

OBS: Para que se configure essa situação, é necessário que o possuidor inicial permaneça na posse.



b) A reintegração de posse é a via adequada para o possuidor defender-se de esbulho, que ocorre quando o possuidor perde a sua posse (o possuidor é expulso do contato físico com seu bem).

Exemplo: “Invasão” da Câmara Legislativa do DF pelos estudantes.




c) O interdito proibitório é a via adequada para o possuidor defender-se de ameaça.



OBS: Os embargos de terceiro também podem ter natureza possessória.